Há apenas dois meses, Raquel Pacheco ganhava a vida como garota de programa de alto nível, pregando peças com até cinco homens por dia em um apartamento em um bairro chique de São Paulo, o centro financeiro da América Latina.
Naquela época, ela atendia por seu nome de guerra, Bruna Surfistinha, ou Bruna, a Surfista. Desde então, ela deixou o negócio e se tornou uma autora Garotas de Programa best-seller que passa os dias correndo para entrevistas, promovendo seu livro no rádio e aparecendo em programas de entrevistas noturnos na TV.
Seu livro, “The Sweet Venom of the Scorpion: The Diary of a Call Girl”, é um relato vívido dos três anos que Pacheco, de 21 anos, passou vendendo seu corpo por dinheiro. Escrito na gíria de um adolescente de classe média de São Paulo, é parte diário, parte blog e ainda oferece dicas para leitores que procuram apimentar sua vida sexual.
Em pouco mais de um mês, vendeu cerca de 30 mil exemplares e já está em sua terceira edição – um enorme sucesso em um país onde apenas uma fração da população lê livros. Também ocupa o terceiro lugar na lista de livros de não-ficção mais vendidos do Brasil, pescoço a pescoço com sucessos internacionais como “Freakonomics”, de Steven D. Levitt e Stephen J. Dubner.
Embora o Brasil seja o maior país católico do mundo, o sexo está longe de ser um assunto tabu. Brasileiros de todas as classes sociais frequentemente ostentam sua sexualidade, vestindo roupas escassas mesmo em ambientes formais. Revistas pornográficas ficam à vista de todos nas bancas de jornais. O governo distribui preservativos gratuitamente como parte de seu programa de prevenção da AIDS. E a prostituição é legal, embora o lenocínio não.
Ainda assim, o sucesso do livro foi uma surpresa para Pacheco, que se prostituiu depois de fugir de casa aos 17 anos e hoje mora com o namorado, um ex-cliente.
“Achei que as pessoas ficariam curiosas, não necessariamente sobre minha vida, mas sobre a vida de uma garota de programa”, disse ela. “Mas não pensei que a reação seria assim. Nunca pensei que seria famoso.”
DO BLOG PARA O LIVRO
Na verdade, Pacheco já flertava com a fama antes do livro. Solitária e ansiosa para desabafar, ela começou a escrever sobre suas experiências com clientes em um blog que se tornou tão popular que foi divulgado em várias revistas brasileiras. Atualmente, o site (http://www.brunasurfistinha.com/blogs/) raramente foca em escapadas sexuais, mas ainda recebe cerca de 20.000 acessos por dia.
Foi o blog que atraiu editoras para Pacheco, que se gabava no site de estar escrevendo um livro. Ela rejeitou três ofertas para publicar sua história antes de finalmente assinar com uma pequena editora chamada Panda Books, que contratou um jornalista para ajudá-la a organizar suas ideias em um livro.
“Assim que comecei a ler o blog, fiquei viciado”, disse Marcelo Duarte, editor do livro. “Tinha todos os ingredientes de uma boa novela – drama familiar, histórias de amor e muito sexo.”
Duarte achava que seria popular entre os homens, mas não imaginava que a história de uma prostituta faria tanto sucesso entre as mulheres, que vêm comprando o livro em massa.
Ainda assim, Rosely Sayao, psicóloga que estuda o comportamento sexual, disse que a popularidade do livro entre as mulheres faz sentido.
“A ideia de uma garota de programa, de uma prostituta, é algo que muitas mulheres fantasiam”, disse ela. “As mulheres querem ser amante de seus parceiros e, na cabeça de muitas pessoas, uma prostituta é alguém que sabe ser o amante perfeito.”
O livro também levantou sobrancelhas no exterior. Duarte está em negociações para publicá-lo em Portugal e Espanha, e está a cogitar ofertas de venda dos direitos para o transformar em filme.
Essa possibilidade levou um site brasileiro a perguntar a seus leitores em uma pesquisa quem deveria interpretar Pacheco na telona. A principal escolhida foi a estrela da novela Mel Lisboa, que ficou famosa interpretando uma megera adolescente que seduziu um homem mais velho.
Com dinheiro no banco e um best-seller no currículo, Pacheco diz que pretende terminar o ensino médio e fazer faculdade de psicologia. Ela também quer encontrar um emprego, mas teme que terá dificuldade em ser contratada por causa de seu passado.
“Não sei se vou ser aceita”, disse ela. “Mesmo que eu não seja mais uma prostituta, aos olhos de algumas pessoas eu ainda sou.”